A história do Rayo Vallecano, um dos clubes mais engajados da Espanha

Lucas Silva
6 min readJun 8, 2022

--

Com quase 100 anos de história, o Rayo Vallecano de Madrid é um dos clubes mais engajados da Espanha e do mundo, com uma rica história e uma torcida muito única. Chegou a hora de falar do maior clube da capital espanhola. Segue o fio.

A REGIÃO

Antes de falarmos do time, é legal entender onde o Rayo nasceu: Vallecas foi um município na Espanha, conhecido por habitantes ‎‎da classe operária. Em 1950, a região foi anexada pelo município de Madrid, tornando- se parte da comunidade autônoma da capital.

Hoje, Vallecas corresponde a um bairro em Madrid dividido em dois distritos: Puente de Vallecas e Villa de Vallecas. A região corresponde a mais de 70km² com mais de 300 mil habitantes.

O bairro de Vallecas ficou conhecido pela sua resistência à ditadura de Francisco Franco. E apesar de não ter uma grande influência no futebol, Vallecas é casa de dois grandes jogadores da Espanha: o meia Koke, do Atlético de Madrid, e do atacante Álvaro Negredo, do Cádiz.

Mas, o maior orgulho deste bairro madrilenho é o seu clube de futebol e sua torcida única e apaixonada na Espanha, engajada em causas sociais, seja dentro ou fora de campo: o Rayo Vallecano de Madrid.

RAYO É VALLECAS

A Agrupación Deportiva El Rayo foi fundada em 29 de maio de 1924, 98 anos atrás. De 1931 até 1936, a equipe participou do campeonato da Federação Trabalhadora de Futebol, filiando-se à Federação Castellana ao fim da Guerra Civil, em 1939.

No mesmo ano, Miguel Rodríguez Alzola assumiu como presidente do clube. Em 1947, o time foi renomeado para Agrupación Deportiva Rayo Vallecano. Já na temporada 1948/49, o Rayo conseguiu o acesso à Terceira Divisão.

Até 1949, o time usava uniformes totalmente brancos. Neste ano, em um acordo com o Atlético de Madrid, o Rayo adicionou uma faixa horizontal vermelha na camisa, em homenagem ao River Plate enquanto recebia jogadores dos colchoneros.

Os franjirrojos só chegariam à segundona em 1956. Depois de alguns anos no 2° nível, a equipe foi rebaixada na temporada 1960–61. O Rayo só voltaria a 2ª divisão na temporada de 1964–65.

Em junho de 1976 o atual estádio do time, o Estadio de Vallecas, foi inaugurado, com derrota do Rayo para o Real Valladolid por 1 a 0. Na temporada 1976/77, o time conseguiu o seu primeiro acesso para a La Liga.

Na elite, recebeu a alcunha de “matagigantes”, após derrotar Real Madrid, Barcelona, Atlético de Madrid, Valencia e Athletic Bilbao na mesma temporada. O clube ficou três temporadas na elite, até cair em 1979–80.

Até os anos 2000, o Rayo foi um clube ioiô. O clube chegou a jogar a Copa da UEFA em 2000/01, ano em que também surgiu a ala feminina do clube rayado. No torneio intercontinental, o time chegou até as semifinais, caindo para o Deportivo Alavés.

Entre 2003 e 2011, o time voltou a se desestabilizar, passando oito anos na segundona. Em 2011, o empresário Raúl Martín Presa comprou 98,6% das ações do Rayo, tornando-se presidente e assumindo as dívidas. No mesmo ano, o time voltou à 1ª divisão.

Desde a época 2012/13, o Rayo tem vivido a sua melhor fase, conseguindo o 8º lugar naquela temporada, melhor da história do clube. Entre acessos e descensos, o time retornou a La Liga na temporada 2020/21.

Na última temporada, o time de Andoni Iraola começou bem, mas foi caindo de produção no decorrer da temporada. Com Falcao Garcia no elenco, os rayistas ficaram na 12ª colocação de La Liga e conseguiram chegar às semis da Copa do Rei, caindo para o Real Betis.

VALLECAS É RAYO

A frase que melhor define o Rayo é “Pequeno no esporte, grande nos valores”. Mesmo não tendo tradição dentro de campo, o sentimento de pertencimento do torcedor com o clube une todo o bairro de Vallecas. O Rayo trata suas origens com orgulho.

Um caso conhecido é o de Carmen Martínez Ayuso. Em 2014, a senhora de 85 anos foi despejada de casa após 50 anos no bairro de Vallecas. A senhora perdeu a casa devido a um empréstimo de 40 mil euros que seu filho realizou junto a um agiota.

Mas o bairro e o Rayo não poderiam virar as costas para a situação. O clube, através do treinador na época Paco Jémez, anunciou que iria pagar o aluguel de um apartamento para a idosa pelo resto de sua vida. Seus torcedores também realizaram diversas manifestações de apoio.

Outro caso conhecido é de Roman Zozulya. O atacante ucraniano foi contratado pelo Rayo em 2017, mas a torcida encontrou fotos do mesmo envolvido com movimentos neonazistas ucranianos. A revolta da torcida foi tanta que, no dia seguinte ao anúncio, o jogador cancelou o negócio.

Mais ainda: em 2019, quando estava no Albacete, Zozulya reencontrou a torcida do Rayo em Vallecas. Os Bukaneros, torcida ultra famosa por promover gestos e cantos antifascistas, xingou tanto o atacante de “nazista” que o jogo foi suspenso pelo árbitro.

O Rayo é tido como um clube progressista e de esquerda. Seu maior rival é o Atlético de Madrid, já que muitos torcedores do Rayo acusam o Atlético de não ser um clube de esquerda de fato.

Torcedores adeptos à política de direita são inimigos declarados dos Bukaneros, casos da Ultras Sür, do Real Madrid e da Frente Atlético, do Atlético de Madrid. Por outro lado, o time compartilha bons laços com o St. Pauli, da Alemanha, no chamado “Clássico da Amizade’’.

O uniforme do Rayo já foi usado como manifestação em prol de causas sociais. Em 2015, por exemplo, a tradicional faixa diagonal estampou a bandeira LGBT, em favor dos direitos da comunidade LGBTQIA +.

Mas, nem tudo são flores. Há informações de um certo descaso com o futebol feminino. Na última temporada, as jogadoras denunciaram que estavam sem equipe médica, tendo que ser atendidas por médicas dos adversários, como dito pela Tati Mantovani.

Em fevereiro, o clube anunciou a chegada do técnico Carlos Santiso para o Rayo feminino. Carlos teve um áudio vazado dizendo que, para que um time realmente se unisse, os jogadores precisam “comer uma mulher juntos”, em referência a um caso real de estupro coletivo.

No dia 15 de março, foi reportado que as atletas tiveram a luz cortada por atraso de pagamento. As atletas já se queixavam, além da falta de equipe médica, da ausência de vagas no estacionamento do CT. No fim do campeonato, foram rebaixadas na lanterna.

Se você quiser entender mais sobre a situação envolvendo Carlos Santiso, o presidente Raúl Martín Presa e o descaso no futebol feminino, o Copa Além da Copa compilou essa história e mais algumas sobre o Rayo.

Seja como for, mesmo não tendo uma galeria recheada de troféus, o Rayo Vallecano de Madrid leva consigo um orgulho imenso por ser de onde é e pela sua torcida fiel e fanática. Mais do que isso, carrega o respeito de muitos clubes pelos seus ideais e pela sua luta.

--

--

Lucas Silva
Lucas Silva

Written by Lucas Silva

Jornalista. São Paulo, Brasil. Passagens por Torcedores.com, Esportudo e Bolavip Brasil.

No responses yet